“Gelo ardido e fogo derretido”
Estou de molho,
Estou a pensar,
E abro um olho.
O outro fica a descansar,
Só para sentir meio mundo acordado.
O resto não interessa, passa-me ao lado.
Se metade é um quarto de dois
Habita a dor pior num só planeta.
Não chega a faísca de dois sóis
Para derreter um só cometa.
Tal é o gelo nesse lado
Que congela quem passa por aí;
Mumifica e deixa ancorado
O meu coração preso a ti.
Gelaste por completo
De ti estás não sei onde;
Tua alma onde se esconde?
Talvez colada ao tecto.
Passa para o lado de cá,
Onde se ouvem os passarinhos,
Cantam quando fazem os ninhos,
Voam sem chegar mesmo lá.
Lugar onde a emoção trespassa as palavras,
Sítio onde a água emerge sobre o fogo.
Altar dos oceanos incomparáveis e inalcançáveis
Onde mesmo sem querer me afogo.
Mas há em ti uma catedral de esperança,
Embelezada pelos candelabros resplandecentes
dos teus olhos.
Há algo que me faz acreditar que a fera é mansa
Talvez transportada para outros ambientes
sem restolhos.
Já bebi de ti mais do que devia,
Contaminaste-me com o teu ser.
Senti fogo e gelo e não podia,
Menos semelhantes haver.
Veneno esse que me enlouquece,
Forte o teu peito contra o meu.
Com o calor derrete-se o que aquece
E do meu já te perdeste no céu.
Ardi o teu gelo assim que derreteste o meu fogo
Hoje te encontro, amanhã assisto ao nosso desencontro
Fiel de ti que me procuras mais uma vez e logo
Derreteu-se o meu fogo e ardeu-se o teu gelo e p(r)onto.
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